As relações históricas de trabalho da mulher demonstram um tratamento desigual em relação aos homens. O Código Civil de 1916[1] informava que o homem era o chefe da Sociedade Conjugal e ainda, que era o representante legal da família e que competia a ele o direito de autorizar a profissão da mulher.
Art. 233. O marido é o chefe da sociedade conjugal.
Compete-lhe:
I. A representação legal da família.
II. A administração dos bens comuns e dos particulares da mulher, que ao marido competir administrar em virtude do regime matrimonial adaptado, ou do pacto antenupcial (arts. 178, § 9º, nº I, c, 274, 289, nº I, e 311).
III. Direito de fixar e mudar o domicílio da família (arts. 46 e 233, nº IV).
IV. O direito de autorizar a profissão da mulher e a sua residência fora do tecto conjugal (arts. 231, nº II, 242, nº VII, 243 a 245, nº II, e 247, nº III).
V. Prover à manutenção da família, guardada a disposição do art. 277.
Nesse sistema os homens eram encarregados de prover a manutenção da família ao passo que a mulher, na grande maioria das vezes, cuidava da educação dos filhos e dos afazeres domésticos, ficando assim afastadas do mercado de trabalho.
Com o passar dos anos as mulheres começaram a perceber que essa supremacia masculina poderia desaparecer e foram saindo de casa em busca de emprego. Fatores históricos, como a 2ª Guerra Mundial, também contribuíram para que tal fato acontecesse.
Prover o auto-sustento gerou mudanças significativas na vida das mulheres, inclusive na formação das famílias. As mulheres passaram a encarar o aspecto profissional como mais importante e as funções de esposa, mãe e dona de casa foram sendo deixadas de lado. Nesse contexto as famílias deixaram de ser numerosas e tornou-se mais comum as separações entre casais.
A partir desse momento, as portas do mercado de trabalho começaram a se abrir para o sexo feminino, porém de forma inadequada. Os empregadores, visando acima de qualquer coisa o lucro desenfreado, começaram a explorar essa mão de obra. Nessa época as obreiras cumpriam jornadas exorbitantes, com salários muito inferiores aos que eram pago aos homens pelas mesmas tarefas.
Diante do quadro apresentado e também da influência internacional, viu-se o Estado obrigado a interferir nas relações trabalhistas, regulamentando e protegendo o trabalho feminino, ainda que de forma tímida no primeiro momento.
No preâmbulo da Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) encontramos:
Considerando que existem condições de trabalho que implicam, para grande número de indivíduos, miséria e privações, e que o descontentamento que daí decorre põe em perigo a paz e a harmonia universais, e considerando que é urgente melhorar essas condições no que se refere, por exemplo, à regulamentação das horas de trabalho, à fixação de uma duração máxima do dia e da semana de trabalho, ao recrutamento da mão-de-obra, à luta contra o desemprego, à garantia de um salário que assegure condições de existência convenientes, à proteção dos trabalhadores contra as moléstias graves ou profissionais e os acidentes do trabalho, à proteção das crianças, dos adolescentes e das mulheres, às pensões de velhice e de invalidez, à defesa dos interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro, à afirmação do princípio “para igual trabalho, mesmo salário”, à afirmação do princípio de liberdade sindical, à organização do ensino profissional e técnico, e outras medidas análogas; (G.N.)
A Declaração de Filadélfia, datada de 1944, assim prevê em sua alínea a) do Item II:
Todos os seres humanos, sem distinção de raça, credo ou sexo, têm o direito de buscar tanto o seu bem-estar material quanto seu desenvolvimento espiritual, em condições de liberdade e de dignidade, de segurança econômica e de igualdade de oportunidades.
E nessa busca pelo bem-estar, a mulher encontrou o trabalho, que a libertaria da dependência econômica do homem (pai, marido, irmão, filho) e revolucionaria o seu papel na sociedade.
O progresso do grupo social e a modernização das grandes cidades também contribuíram para evolução do pensamento patriarcal dominante à época e as mulheres iniciaram suas conquistas em todos os ramos.
Ainda no âmbito internacional podemos acompanhar a evolução da legislação em favor da proteção da mão de obra feminina. MARTINS (2013, p. 654) cita, na Inglaterra, o “Coal Mining Act”, de 1842, que proibiu o trabalho da mulher em subterrâneo; o “Factory Act”, de 1844, que limitou a jornada de trabalho há 12 horas e a proibiu no período noturno e o “Factory and Workshop Act”, de 1878, que vedou o trabalho perigoso e insalubre.
O autor continua demonstrando a evolução na França onde uma lei, datada de 1874, proibiu o trabalho da mulher em minas e pedreiras e posteriormente, em 1892, outra lei limitou a jornada de trabalho das mulheres em 11 horas e em 1909 nova lei outorgou o direito às mulheres grávidas do repouso não remunerado de oito semanas, vedando o carregamento de objetos.
BARROS (2013, p. 855) ensina que é inegável a influência da ação internacional, em especial da OIT, no desenvolvimento da legislação trabalhista brasileira, inclusive no capítulo que versa sobre o trabalho da mulher. A autora afirmava que no domínio do trabalho da mulher, a ação internacional assumiu dois perfis:
O primeiro, de caráter tutelar, articulou-se em duas direções: de um lado, a disciplina dirige-se à mulher no ciclo gravídico-puerperal (Convenções n. 3, 103 e 183 da OIT) e, de outro, impõe restrições ao trabalho da mulher, em geral, proibindo-lhe atividades insalubres, perigosas e penosas, onde se inclui o trabalho noturno nas indústrias (Convenções n. 4, 41 e 89 da OIT), em regime de horas e extras e com pesos. O segundo perfil caracteriza-se pela necessidade de se atribuir às mulheres igualdade de remuneração, de oportunidade e de tratamento com os homens no trabalho (Convenções n. 100 e 111 da OIT).
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, prevê em seu Artigo VII o princípio da igualdade e da não discriminação:
Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.
Diante do contexto apresentado, a mulher passou a assumir importante papel na sociedade, ganhando cada dia mais espaço no mercado de trabalho e implantando mudanças, inclusive, na participação dos homens nas relações familiares: cuidar dos filhos e dos afazeres domésticos deixou de ser uma obrigação exclusivamente feminina.
Fonte: Este artigo é parte do Capítulo 2 “TRABALHO DA MULHER E PROTEÇÕES LEGAIS” do Trabalho de Conclusão do Curso de Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho apresentado pelo Colaborador Leandro Lopes à Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus.
LEITURAS RECOMENDADAS:
- O Trabalho da Mulher e as Proteções da CLT
- O Trabalho da Mulher no Brasil
- Descanso Semanal Remunerado aos Domingos (Mulheres)
- A Polêmica Estabilidade Provisória da Gestante no Contrato a Termo
________________________________________________________
[1] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l3071.htm. Acesso em: 25/01/2015.