Sob a influência internacional, a crescente ocupação das mulheres no mercado de trabalho e o abuso dos empregadores sobre a mão de obra feminina, que, inclusive, trazia prejuízos à concorrência internacional, viu-se o Estado obrigado a tutelar o direito das trabalhadoras.
Nenhuma mulher se tornou astronauta, juíza da Suprema Corte, presidente de uma corporação apenas por não ser homem. Ou seja, não subiram por necessidade das corporações de diversificar seu quadro. Subiram por seus méritos medidos pelos padrões que valem tanto para homens quanto para mulheres. (PROBST, 2014, p. 5)
A primeira lei brasileira a proteger os direitos das mulheres em matérias trabalhistas foi o Decreto nº 21.417-A, de 17 de maio de 1932, que igualou o salário de homens e mulheres para todo trabalho de igual valor (Art. 1º); proibiu o trabalho noturno (entre 22 e 5 horas) (Art. 2º), proibiu também o trabalho nos subterrâneos, nas minerações, em subsolo, nas pedreiras, nos canteiros de obras, nos serviços perigosos e insalubres (Art. 5º) e na remoção de materiais de pesos superiores ao estabelecido nos regulamentos elaborados pela autoridade competente (Art. 4º). Previu também um descanso obrigatório de quatro semanas antes e quatro semanas depois do parto (Art. 7º), podendo ser aumentados em até duas semanas cada um, mediante atestado médico (§4º do Art. 7º). Para aleitamento ficou assegurado dois intervalos diários de meia hora cada um, nos primeiros seis meses da criança (Art. 11). Em caso de aborto não criminoso era assegurado o direito ao repouso remunerado de duas semanas (Art. 10). Era proibido dispensar a mulher pelo simples fato da gravidez (Art. 13). Os estabelecimentos em que trabalhassem pelo menos 30 (trinta) mulheres com mais de 16 anos de idade eram obrigados a ter local apropriado onde fosse permitido às empregadas guardar sob vigilância e assistência os seus filhos em período de amamentação (Art. 12).
Em sequência ao citado Decreto veio a primeira Constituição Brasileira a tratar da proteção ao trabalho da mulher, a de 1934. Naquela Constituição ficou proibido a diferença de salário para um mesmo trabalho, por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil; vedado o trabalho feminino em locais insalubres, garantido o repouso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e do emprego, prevendo ainda a instituição de previdência em favor da maternidade e de serviços de amparo à maternidade.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 16 DE JULHO DE 1934)
Art. 121 – A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País.
§ 1º – A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar as condições do trabalhador:
a) proibição de diferença de salário para um mesmo trabalho, por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil;
[…]
d) proibição de trabalho a menores de 14 anos; de trabalho noturno a menores de 16 e em indústrias insalubres, a menores de 18 anos e a mulheres;
[…]
h) assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante, assegurando a esta descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e do emprego, e instituição de previdência, mediante contribuição igual da União, do empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da maternidade e nos casos de acidentes de trabalho ou de morte;
A Constituição seguinte, do ano de 1937, informava que a legislação do trabalho deveria observar, dentre outros, que era proibido o trabalho das mulheres em indústrias insalubres e que era assegurada à trabalhadora gestante assistência médica e higiênica e um período de repouso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário.
CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 10 DE NOVEMBRO DE 1937)
Art. 137 – A legislação do trabalho observará, além de outros, os seguintes preceitos:
[…]
k) proibição de trabalho a menores de catorze anos; de trabalho noturno a menores de dezesseis, e, em indústrias insalubres, a menores de dezoito anos e a mulheres;
l) assistência médica e higiênica ao trabalhador e à gestante, assegurado a esta, sem prejuízo do salário, um período de repouso antes e depois do parto; A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) reuniu os diplomas trabalhistas existentes à época e em 1º de maio de 1943 foi aprovada pelo então presidente do Brasil, Getúlio Vargas, conhecido como “Pai dos Pobres” em virtude de inúmeros benefícios garantidos à massa trabalhadora.
MARTINS (2013, p. 656 e 657) ilustra bem as modificações ocorridas na legislação no período de 1943 a 1988 e por isso transcrevemos aqui suas palavras:
Em 1º-5-1943, foi editada a CLT, consolidando a matéria existente na época. A primeira alteração foi do Decreto-lei nº 6.353, de 20-3-1944, admitindo o trabalho noturno da mulher apenas se ela tivesse 18 anos, e em algumas atividades.
A Constituição de 1946 proibia a diferença de salário por motivo de sexo (art. 157, II); vedava o trabalho da mulher em indústrias insalubres (art. 157, IX); assegurava o direito da gestante a descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do emprego nem do salário (art. 157, X); reconhecia a assistência sanitária, inclusive hospitalar e médica, à gestante (art. 157, XIV); previa a previdência em favor da maternidade (art. 157, XVI).
A Constituição de 1967 proibia a diferença de salários e de critérios de admissão por motivo de sexo (art. 158, III); vedava o trabalho da mulher em indústrias insalubres (art. 158, X); assegurava o descanso remunerado à gestante, antes e depois do parto, sem prejuízo do emprego e do salário (art. 158, XI); previa a previdência social, visando à proteção à maternidade (art. 158, XVI). Tinha a mulher direito à aposentadoria aos 30 anos de trabalho, com salário integral (art. 158, XX).
O Decreto-lei nº 229, de 28-2-67, é que fez várias alterações na CLT. Alterou o art. 374 da CLT, permitindo o regime de compensação apenas por acordo coletivo. Modificou também os arts. 389 e 392 da CLT para proporcionar a guarda de filhos das mulheres na empresa, descanso no período de quatro semanas antes e oito semanas depois do parto etc.
O Decreto-lei nº 546, de 18-4-69, permitiu o trabalho da mulher na compensação bancária noturna. O Decreto-lei nº 744, de 6-8-69, autorizou o trabalho da mulher em cargos técnicos ou postos de direção, de gerência ou de confiança; na industrialização de produtos perecíveis.
A Emenda Constitucional nº 1, de 1969, estabeleceu que não seria possível a diferença de salários e de critérios de admissão por motivo de sexo (art. 165, III); proibiu o trabalho da mulher em indústrias insalubres (art. 165, X); assegurou o descanso remunerado da gestante, antes e depois do parto, sem prejuízo do emprego e do salário (art. 165, XI); previu regras de previdência social, visando à proteção à maternidade (art. 165, XVI); possibilitou à mulher à mulher a aposentadoria aos 30 anos de trabalho, com salário integral (art. 165, XIX).
A Lei nº 5.673, de 6-7-71, possibilitou o trabalho noturno da mulher em serviços de processamento de dados (art. 379, IX, da CLT), em indústrias de manufaturados de couro que mantenham contratos de exportação devidamente autorizados pelos órgãos públicos competentes (art. 379, X, da CLT).
A Lei nº 6.136, de 7-11-74, transferiu da empresa para a Previdência Social o ônus da licença-maternidade.
A Lei nº 7.189, de 4-6-84, deu nova redação ao art. 379 da CLT, permitindo o trabalho noturno da mulher com mais de 18 anos.
Pelo discorrido, percebemos que inúmeros diplomas tentavam equilibrar a relação da mulher no mercado de trabalho. A cada situação de desigualdade que se apresentava, tentava o legislador corrigir as distorções. Notamos pela simples leitura dos fragmentos acima que os direitos das mulheres ficaram esquecidos da sociedade por um bom período da humanidade.
Por esse motivo as mulheres foram à luta. Ganharam espaço, conquistaram direitos e sua participação no mercado de trabalho cresceu exponencial nas últimas décadas. Nos dias atuais, o sexo feminino ocupa posições de destaque na sociedade. Estão presentes nos tribunais superiores, nos ministérios, na direção de grandes empresas, nas universidades. Pilotam aeronaves e comandam tropas. A mais alta autoridade do país hoje[1] é uma mulher.
Nenhuma mulher se tornou astronauta, juíza da Suprema Corte, presidente de uma corporação apenas por não ser homem. Ou seja, não subiram por necessidade das corporações de diversificar seu quadro. Subiram por seus méritos medidos pelos padrões que valem tanto para homens quanto para mulheres. (PROBST, 2014, p. 5)
O ápice da conquista dos direitos das mulheres se concretizou em 5 de outubro de 1988, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88) que estabeleceu a igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres, garantindo o tratamento isonômico de todos perante à lei, sem fazer distinção de qualquer natureza, garantindo a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
Logo que foi criada, a Carta de 1988 ganhou o apelido de “Constituição Cidadã”, por ser considerada a mais completa entre as constituições brasileiras e uma das mais avançadas do mundo no âmbito das garantias individuais.
A Constituição Federal de 1988 elenca em seu art. 7º os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais e, no inciso XX, confere especial proteção ao trabalho da mulher:
Art. 7º -São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
[…]
XX – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;
[…]
A Magna Carta de 88 não proibiu, como as Constituições anteriores, o trabalho da mulher em atividades insalubres, o que significa, em outras palavras, que o permitiu. A licença à gestante passou a ser de 120 dias, sem prejuízo do emprego e do salário. Ao estabelecer o princípio da igualdade, vedou a diferença de salário, de exercício de funções e critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.
Estabeleceu, ainda, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias a garantia de emprego à mulher gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Tal garantia foi inovadora no direito brasileiro; nenhuma das Constituições anteriores ou leis infraconstitucionais tinham-na previsto.
Essa garantia é uma efetivação concreta de outros direitos previstos na própria Constituição Federal, trazendo à tona a ideia do neoconstitucionalismo citada no Item 1.1 deste trabalho científico.
Com essa garantia, coloca-se em prática o princípio da dignidade da pessoa humana, a proteção à família, à maternidade, à gestante, à saúde, à vida. Acreditamos, porém, não proteger o mercado de trabalho da mulher, tendo em vista que fere o princípio da igualdade, podendo inclusive gerar certa discriminação na hora da contratação de empregados.
Fonte: Este artigo é parte do Capítulo 2 “TRABALHO DA MULHER E PROTEÇÕES LEGAIS” do Trabalho de Conclusão do Curso de Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho apresentado pelo Colaborador Leandro Lopes à Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus.
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[1] Dilma Rousseff é a atual Presidente do Brasil e foi a primeira mulher a governar nosso País.