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Verdade e Justiça

Venda casada em cinemas

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A venda de alimentos nos cinemas é uma prática comum em todo o Brasil. Por vezes, algumas pessoas são barradas na entrada desses estabelecimentos quando estão levando consigo alimentos adquiridos em outros locais.

Será que essas atitudes estão em sintonia com o Código de Defesa do Consumidor (CDC)? É o que veremos nesse artigo de hoje!

Consoante Art. 39, I do CDC é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços condicionar o fornecimento de um produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço. Em outras palavras, é proibido ao comerciante oferecer um produto a venda e condicionar a compra desse produto à compra de outro qualquer. Tal prática é considerada abusiva e deve ser evitada entre os comerciantes e não pode ser aceita pelos consumidores, pois é direito básico do consumidor a liberdade de escolha (Art. 6º, II do CDC) na aquisição de produtos e/ou serviços.

CDC – Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

Porém, no dia a dia as empresas tentam realizar a venda casada de forma indireta, como acontece em cinemas e outros estabelecimentos Brasil afora. Veja este exemplo: uma estudante de direito de Porto Velho foi ao cinema com o namorado e antes de entrar na sala, comprou um sanduíche em outro local para acompanhar a sessão. No entanto, ao se dirigir à sala de cinema a estudante foi surpreendida por uma funcionária que a informou que não poderia ingressar com o lanche. Inconformada, a estudante indagou a atendente se seria possível ingressar com lanche adquirido no próprio local, ao passo que esta afirmou neste caso sim, poderia ingressar. Nesse momento a estudante solicitou a presença do Gerente, que acabou permitindo sua entrada, porém o constrangimento já havia se consumado.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu um caso semelhante ao ocorrido com a estudante, servindo de importante precedente para nortear a interpretação da lei em casos análogos.

Nessa decisão (Resp. 1.331.948), o STJ garantiu a entrada de consumidores em um cinema do interior de São Paulo com produtos iguais ou similares aos vendidos nas dependências do estabelecimento.

A ação havia sido movida pelo Ministério Público paulista, que considerou abusiva a prática da rede de cinemas ao exigir que alimentos e bebidas fossem comprados em suas próprias lojas, a preços superiores à média do mercado.

O Relator desse recurso, Ministro Villas Bôas Cueva, destacou que a conduta do cinema violou indiretamente o Art. 39, I do CDC: “Ao compelir o consumidor a comprar dentro do próprio cinema todo e qualquer produto alimentício, a administradora dissimula uma venda casada e, sem dúvida alguma, limita a liberdade de escolha do consumidor, o que revela prática abusiva: não obriga o consumidor a adquirir o produto, porém impede que o faça em outro estabelecimento”.

Abaixo a ementa do Acórdão:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. ART. 39, I, DO CDC. VENDA CASADA. VENDA DE ALIMENTOS. ESTABELECIMENTOS CINEMATOGRÁFICOS. LIBERDADE DE ESCOLHA. ART. 6º, II, DO CDC. VIOLAÇÃO. AQUISIÇÃO DE PRODUTOS EM OUTRO LOCAL. VEDAÇÃO. TUTELA COLETIVA. ART. 16 DA LEI Nº 7.347/1985. SENTENÇA CIVIL. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. EFICÁCIA ERGA OMNES. LIMITE TERRITORIAL. APLICABILIDADE. 1. A venda casada ocorre em virtude do condicionamento a uma única escolha, a apenas uma alternativa, já que não é conferido ao consumidor usufruir de outro produto senão aquele alienado pelo fornecedor. 2. Ao compelir o consumidor a comprar dentro do próprio cinema todo e qualquer produto alimentício, o estabelecimento dissimula uma venda casada (art. 39, I, do CDC), limitando a liberdade de escolha do consumidor (art. 6º, II, do CDC), o que revela prática abusiva. 3. A restrição do alcance subjetivo da eficácia erga omnes da sentença proferida em ação civil pública envolvendo direitos individuais homogêneos aos limites da competência territorial do órgão prolator, constante do art. 16 da Lei nº 7.347/1985, está plenamente em vigor. 4. É possível conceber, pelo caráter divisível dos direitos individuais homogêneos, decisões distintas, tendo em vista a autonomia de seus titulares. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

Dessa forma, impedir consumidores de acessarem livremente às salas de exibição dos cinemas portando produtos adquiridos em outros estabelecimentos é abusivo e acarreta no cerceamento ao direito de liberdade de escolha, devendo tal conduta ser evitada pelas empresas, pois além de ilegal é antipática e improducente.

Por sua vez, os consumidores não devem aceitar este comportamento das empresas, manifestando imediatamente sua insatisfação quando tais fatos ocorrerem e demonstrar que conhecem seus direitos, exigindo que estes sejam respeitados.

Fonte: STJ

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